Mestrado longe de casa: estudante do interior do Piauí compartilha como é conciliar estudos, vida pessoal e distância da família
- ruthycosta

- 13 de nov.
- 5 min de leitura
Atualizado: há 6 dias
Por Paula Marques e Maria Clara Oliveira

Quase quatro milhões de pessoas de acordo com o censo de 2022 feito pelo IBGE(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) necessitam ir para fora de seus municípios de origem para obterem um curso superior. Este desafio se estende para a pós-graduação. Iaquelly de Sousa, natural de Ipiranga- PI, é uma das estudantes que enfrenta os desafios de estudar longe da sua cidade para cursar mestrado em Comunicação na UFPI(Universidade Federal do Piauí), em Teresina. Entre saudade da família, rotina intensa e pressão acadêmica, ela compartilha sua experiência e os aprendizados adquiridos ao longo do mestrado.
Maria Clara Oliveira: O caminho de quem escolhe mestrado muitas vezes é norteado pelo desejo de seguir a docência. Então; como surgiu esse desejo pela docência? Porque hoje em dia não vemos tanto interesse assim nos estudantes de jornalismo pela docência. Era algo que você já tinha em mente desde o início da graduação ou você descobriu durante o curso?
Iaquelly de Sousa: No segundo período, em uma semana de Comunicação, a liga JOEME fez uma apresentação e eu achei muito legal. Eu não sabia direito o que eu queria, mas as pessoas diziam que eu me comunicava muito bem. Não era algo ligado à televisão, porque pouco se vê de jornalistas pretos na TV, então nunca foi uma expectativa minha. Quando entrei na liga JOEME, conheci de fato a pesquisa e a extensão, e com as professoras Mayara e Thamyres, percebi que era algo muito confortável para mim.
Maria Clara: Então a docência talvez tenha surgido desse lugar onde você não viu um certo pertencimento por não ter jornalistas pretos na área?
Iaquelly: Também. Quando você entra no curso, você tem uma visão muito limitada do que é o jornalismo. Eu só conseguia pensar sobre a TV. E eu entendia que eu não queria rádio e indo para o terceiro período foi quando eu pensei que eu queria a docência a partir da liga. Foi o espaço que eu me senti mais… [ pensa e fala pausadamente] eu.
Maria Clara: Quais foram os principais desafios que você enfrentou desde que se mudou para Teresina para cursar mestrado?
Iaquelly: Teve vários. Eu sofri um assalto esperando o ônibus pra ir pra universidade. Eu tenho síndrome de pânico. E eu nunca tinha me separado da minha família, então foi muito difícil. Eu passei um ano em Teresina, depois desse assalto eu fiquei de Ipiranga para Teresina, por conta do meu medo. Assim, eu não sei nem como eu falo isso, para não desmotivar; mas infelizmente o ambiente da universidade é muito grande, não tem segurança para dar conta. Eu sou mulher, na turma eram poucas pessoas. Agora está mais tranquilo porque eu estou finalizando o estágio [ docente], mas foi um momento de muita tensão, muita saudade e de ansiedade. O dinheiro da bolsa [do mestrado. O valor é 2.100 reais] é bom, mas não é compatível com o custo de vida de Teresina. Graças a Deus eu sou bolsista CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) se não fosse a CAPES eu tenho certeza que eu não conseguiria de forma nenhuma fazer esse mestrado. Mudou a minha realidade, mas ainda sim, tem muitos percalços para quem quer de fato a docência porque aqui no Piauí só tem um mestrado de comunicação que é o da UFPI. E doutorado não tem aqui no Piauí.
Maria Clara: E como você lida com a saudade de casa?
Iaquelly: No início foi muito difícil, eu sou muito apegada a minha vó e aos meus bisavós. Mas, graças a Deus eu tenho um marido que topa tudo, sempre, desde a graduação. Ele foi o meu alicerce. Eu chorava muito e ele me acalmava. Ele me falava: “Lembra de quem você é, de onde você veio. Essas dificuldades são passageiras.”
Maria Clara: Entre essas dificuldades que você já citou, você já pensou em desistir do mestrado em algum momento?
Iaquelly: Nossa! Várias vezes, várias vezes. Como eu te falei nesse período do assalto, fiquei com muito medo. Eu fui para a delegacia e depois eu fui chorando para a universidade porque eu tinha uma apresentação e eu sempre fui muito responsável. Quando eu cheguei lá, a minha professora Martha me acalmou. Tiveram diversos momentos em que eu pensei em desistir e… (Fez uma breve pausa antes de continuar) Terminava que eu ia me consolando pensando aonde eu tinha chegado e como foi difícil chegar naquele espaço, porque vários estudantes sonharam com essa vaga que eu estava ocupando e eu sou uma pessoa bolsista. E aí eu coloquei na minha cabeça o valor dessa bolsa para mim e o meu sonho. Lembrava da Iaquelly de Ipiranga, pensava que já tinha passado por coisa pior e fui levando. Estou levando até hoje. O mestrado não foi só conquista minha, foi dos motoristas de van. No meu TCC da graduação eu até agradeço cada um dele. Foi da minha família, que de certa forma, mesmo indo contra, me incentivaram da maneira deles. Então, eu lembro que estou representando cada um deles, e que se eu desistir, eu tenho cada uma dessas pessoas para dar conta. Eles me seguraram para não desistir. Lembro também das pessoas da UESPI e penso: Desistir não é uma opção.
Maria Clara: Eu acho que para você, não sei, mas eu acho que seria uma satisfação imensa voltar para a UESPI
Iaquellly: Eu me sinto muito privilegiada por conversar com a Mayara e a Thamyres de igual para igual. Eu sonho com isso, de poder falar que eu trabalho com pessoas que foram enormes referências para mim. A Thamyres foi minha primeira referência, a Mayara foi referência, quando a Jaque [ também professora do curso de jornalismo] voltou. Eu estava no meio da graduação, mas ela foi uma mãe para mim. Então, voltar a contribuir com esse espaço que, para mim, foi de referência com essas professoras, pra mim é um sonho.
Maria Clara: Que conselho você daria se alguém de Picos quisesse fazer um mestrado em Teresina?
Iaquelly: Eu diria: Não desista do sonho porque ele é possível. Pense muito no que você tem, na motivação da sua vida. A minha maior motivação sempre foi a minha família e os lugares onde eu queria chegar para de que, de alguma forma, eu contribuísse com a minha família. E pensar em uma pessoa…uma pessoa como eu que saí de Ipiranga. Se o seu sonho é a docência, faça tudo que estiver ao seu alcance para conseguir chegar lá. Você vai conseguir chegar lá. Você não é menor ou menos inteligente do que ninguém. Você é capaz. Se é o seu sonho, você tem que tentar, só tente.




Comentários