Redes de apoio e persistência: O desafio que as mães universitárias enfrentam na graduação
- JOAO MIKAEL DOS SANTOS LOPES
- 11 de nov. de 2024
- 5 min de leitura
Por Maria Clara Leal e Vanessa Cristina Alencar
Ingressar e se manter no ensino superior já é um desafio para muitos estudantes, mas para as mães universitárias, esse percurso se torna ainda mais desafiador e exige resiliência e apoio para conciliar a vida acadêmica e a maternidade.
Dividir o tempo entre gestação, maternidade, estudos e, muitas vezes, trabalho e afazeres domésticos demanda um equilíbrio delicado que exige grande esforço emocional e físico. Nesse cenário, as redes de apoio – que podem incluir familiares, amigos, instituições e políticas públicas – desempenham um papel fundamental para a permanência dessas mulheres no meio acadêmico. Essa dificuldade é refletida em índices preocupantes de desistência: a falta de apoio adequado contribui para que muitas estudantes abandonem seus cursos, especialmente em instituições que não estão preparadas para atender às necessidades específicas dessas alunas.
Dados de 2023 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam números da evasão escolar da sociedade brasileira. A pesquisa engloba pessoas de 15 a 29 anos, e os dados femininos mostram uma realidade de desistência por causa da gravidez. O maior índice vem da necessidade que essas mulheres encontram de entrar no mercado de trabalho, correspondendo a 25,5%; seguido pela gravidez, com 23,1%.

Esses dados nos levam a refletir sobre o quanto a conciliação entre maternidade e estudos pode ser profundamente desafiadora para as mulheres. A ausência de uma rede de apoio adequada não apenas contribui para a sobrecarga emocional e física dessas mães, mas também está diretamente ligada aos índices de evasão universitária e atraso na conclusão dos cursos. Muitas sequer conseguem ingressar no ensino superior, pois as barreiras já começam antes mesmo da matrícula.
A falta de suporte pode levar ao abandono dos sonhos acadêmicos, ao passo que uma rede de apoio eficaz tem o potencial de aliviar essas dificuldades, possibilitando que essas mulheres perseverem e alcancem seus objetivos acadêmicos.
"A minha mãe sempre me incentivava e dizia: 'Você não vai desistir, você vai. Já está perto de se formar, então aguenta mais um pouco.' Ela sempre me incentivava".
Para compartilhar uma realidade pessoal de como essas redes de apoio fazem a diferença, conversamos com a Keila Bezerra da Silva, 26 anos, natural de Ipiranga, mãe de dois filhos, técnica em enfermagem e estudante do 7° período de Jornalismo da UESPI de Picos. A estudante compartilhou um pouco de sua rotina, como consegue equilibrar as responsabilidades e uma dica para outras mães que estão vivenciando o mesmo.
VANESSA CRISTINA - Como é a sua vida atualmente?
KEILA SILVA- Então, a minha vida é bastante corrida. Para muitos, pode até não parecer, mas é. Atualmente, estou um pouco mais tranquila porque estou focada apenas na questão da família, cuidando dos meus filhos. A UESPI, por exemplo, até o início do ano, eu estudava aqui em um curso integral, o que dificultou um pouco, pois fazia o curso técnico em enfermagem, que tinha aulas presenciais aos sábados e domingos. Além disso, eu trabalhava na Secretaria de Saúde da minha cidade e estava grávida. Tenho um filho de 7 anos que é autista, nível 2. Eu vivia assim, na correria total, sem tempo praticamente para fazer nada para mim, além das responsabilidades do ambiente de estudos e de casa, cuidar dos filhos e trabalhar. Como eu disse, minha vida é bastante corrida; não tenho muito tempo para fazer coisas para mim e estou o tempo todo cansada.
VANESSA - Mas como foi que você conseguiu conciliar tanto essa vida como mãe e a vida como estudante?
KEILA - Eu acho que a questão principal para mim é que eu tenho muito apoio da minha família, principalmente da minha mãe. Ela sempre fez de tudo por mim e me ajuda demais nessa questão dos meus filhos. Sempre que venho aqui para a universidade, é ela quem fica com eles. Se não fosse o apoio da minha mãe, com certeza eu não conseguiria conciliar cuidar dos meus filhos e estudar. Às vezes, quando a rotina fica mais apertada, temos períodos mais corridos, com mais aulas, tanto de manhã quanto à tarde, o que dificulta um pouco. Eu confesso que já pensei em desistir do curso de jornalismo por conta dessa correria e de não ter muito tempo para ficar com meus filhos. Mas a minha mãe sempre me incentivava e dizia: 'Você não vai desistir, você vai. Já está perto de se formar, então aguenta mais um pouco.' Ela sempre me incentivava, me dando forças. Por isso, eu acho que tenho que agradecer muito a ela pelo apoio que sempre me deu.
MARIA CLARA - Você sentia que dava mais prioridade para essa identidade de mãe ou a identidade de estudante, ou você sempre conseguiu equilibrar muito bem?
KEILA - Eu sempre consegui equilibrar. Sempre que tenho muitos trabalhos para fazer, ou agora, que estamos no período de desenvolver o TCC 1, eu tiro um tempo para estudar e desenvolver meus trabalhos acadêmicos, mas também dedico um tempo para ficar só com os meus filhos. Assim, consigo conciliar essas duas questões de forma tranquila. Nunca atrapalhou em nada.
MARIA CLARA - Como você ficou grávida durante o curso de jornalismo, você se sentiu acolhida pela universidade e pela sua família para retornar à universidade?
KEILA - Assim, pela universidade, eu acho que não foi tanto assim, mas sim pela minha família, que sempre me incentivou a continuar nos estudos e a não desistir. E é isso.
VANESSA - Quais os recursos e os serviços que a universidade oferece que você acha mais útil?
KEILA - Eu utilizei a licença maternidade. As mães, quando têm seus bebês, têm três meses de licença maternidade, concedidos aqui pela UESPI. Durante esse período, conseguimos fazer as atividades de casa; os professores enviam os materiais e fazem todo aquele acompanhamento à distância, como se, nesse tempo, estivéssemos voltando ao ensino remoto. No entanto, eu acho isso muito pouco, porque, após três meses, para voltar à universidade, o bebê ainda está muito pequeno. Muitas vezes, ele não vai nem querer tomar mamadeira, preferindo apenas a amamentação. Isso dificulta muito essa parte. Além disso, eu não tenho conhecimento de nenhum outro benefício que a UESPI ofereça às mulheres que têm crianças.
MARIA CLARA - E qual a importância de ter uma rede de apoio, entre outras mães, que estão passando pelas mesmas situações?
KEILA - Eu acho que a questão da rede de apoio é que uma mãe que passa pela mesma situação pode inspirar outras mães a continuarem na universidade. Não é porque você teve um filho que vai deixar de estudar. É possível conciliar as duas coisas, mas é preciso ter muita força de vontade e não desistir quando as coisas começarem a apertar.
MARIA CLARA - Você gostaria de ver alguma mudança na cultura acadêmica que apoie melhor as mães estudantes?
KEILA - Sim, eu acho que sim. Acredito que muita coisa poderia mudar, como, por exemplo, a questão da inclusão de mães. Deveriam existir políticas públicas no ambiente universitário voltadas para mães com filhos, pois muitas acabam desistindo dos estudos por não terem com quem deixar seus filhos. Considerando que vivemos em um mundo tão moderno, deveríamos tentar adequar essas questões. Acredito que políticas públicas na universidade voltadas para essas mães poderiam ser implementadas.
VANESSA - Você tem alguma dica para as pessoas conseguirem enfrentar essa rotina de mãe e estudante?
KEILA - Acho que a questão principal é o apoio: buscar pessoas que te apoiem, que te ajudem, e tentar conversar com os professores para conseguir essa conciliação. Muitas vezes, quando você expõe o que está acontecendo, as pessoas ao seu redor tentarão te ajudar, vão te estender a mão e encontrar uma solução para o problema. Porém, se você começa a enfrentar dificuldades e se fecha, sem buscar ajuda, tudo ficará mais difícil.
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